Ensino do BIM: quais são os pontos-chave?

Coordenar – Artigos • 5 de março, 2020
Omomento atual é oportuno para a discussão do ensino de BIM no Brasil. Tenho observado que muitos cursos de MBA atuais são muito expositivos e pouco inovam em termos pedagógicos. Outros tem um foco excessivo nos softwares e na tecnologia, relegando para segundo plano a formação de gestores.
A abordagem do BIM, em minha opinião, deve ter como foco a INOVAÇÃO na construção civil. Ensinar BIM para continuarmos a empilhar tijolos, agrega pouco valor.
BIM é um todo, precisa ser tratado de forma holística e não através de disciplinas atomizadas e desconectadas. Infelizmente é essa a tendência que tenho observado ocorrer e que exige uma profunda reflexão principalmente dos professores.
Estive em 2011, em Haifa, participando de um workshop sobre o ensino de BIM. Esse workshop foi conduzido pelo Prof. Rafael Sacks e reuniu professores de diversas partes do mundo. Foram discutidas diversas abordagens. O ponto em comum foi a necessidade da inovação na maneira de ensinar. Creio que reproduzir a forma convencional: disciplinas + trabalhos + prova, pouco irá acrescentar aos alunos.
O professor deve ser um facilitador e ajudar ao aluno construir o seu próprio conhecimento através da experiência. Acredito muito pouco na visão do aluno como “repositório” de informação, pois despejar informação é pouco eficaz para o aprendizado.
Vou compartilhar nesse post algumas das lições aprendidas nesse workshop.
Como introdução ao workshop, Rafael Sacks e Paul Teicholz realizaram uma discussão na rede LinkedIn, colocando algumas questões para os profissionais. Descrevo a seguir algumas das opiniões relevantes e ao final, algumas conclusões tiradas e debatidas no evento.
Questões formuladas no LinkedIn:
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Qual é a sua opinião sobre o conteúdo adequado de educação em BIM?
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Quais competências em BIM você procura em Arquitetos e Engenheiros ?
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A educação em BIM deve/pode tomar o lugar de cursos de desenho técnico?
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A educação em BIM deve ser aproveitada para melhorar as habilidades de colaboração interdisciplinar?
Principais respostas:
- “BIMing”, como uma atividade (processo), pretende ser multidisciplinar. Assim como um arquiteto e o construtor devem saber algo sobre muitas áreas especializadas diferentes, o mesmo acontece com um modelador;
- Idealmente, para mim, um modelador terá construído, ou ter sido diretamente envolvido na construção do tipo de coisa que ele está modelando, ou construindo virtualmente;
- Isso implica que algum tipo de aprendizado – com as “mãos na massa” sobre o material não-virtual é necessário.
- Ensinar o projeto ao desconstruir e reconstruir os edifícios mais importantes de hoje e obter dados para verificar como os edifícios podem ser mais eficientemente feitos. Exemplo: de / reconstruir o Bilbao de Gehry para ver se como menos energia incorporada poderíamos produzir um resultado melhor;
- Aprender vendo exemplos de construções reais e comparando-as com as construções virtuais em BIM. Um estudante vai para a obra ver a montagem de estruturas metálicas e , em seguida, retorna para a aula e com a ajuda da construção virtual em BIM constrói e detalha estruturas metálicas;
- Usar o modelo virtual para ensinar o novo processo de projeto com informações verificáveis. Não é o ensino de um software, mas de um processo. Da realidade para o BIM e vice-versa.
- O BIM é sobre banco de dados e interações de softwares? Então eu acho que isso é o que a educação deve ser sobre o BIM;
- Entender como o software (bancos de dados e similares) “andam e conversam” podem fazer alguém ter valor inestimável na minha opinião, porém isso é uma falha de conhecimento frequente na maioria das pessoas que trabalham com BIM, limitando assim o seu potencial.
- BIM é primariamente sobre processos e colaboração, não sobre softwares e bancos de dados
- Ensinar BIM somente do ponto de vista de sua tecnologia não irá preparar você para a realidade de executar os projetos em BIM;
- Há vários exemplos de uso para os modelos criados, desde estimativas até a coordenação, a simulação de energia, produção de desenhos e muitos mais. Cada um requer coisas diferentes a partir dos modelos e, a menos que você prepare as suas atividades em conformidade, muitas das vantagens são perdidas ou improdutivas.
- Uma área que eu acho que pode estar faltando nos programas acadêmicos são … exercícios e práticas multidisciplinares para o BIM;
- Os cursos de Arquitetura, Engenharia, Construção e Gestão parecem funcionar como silos em muitas instituições acadêmicas o que reforça ainda mais o problema que nossa indústria enfrenta hoje. Como BIM é muito mais eficaz como um processo multidisciplinar, é importante que os alunos sejam capazes de experimentar este tipo de dinâmica logo na escola antes de entrar no local de trabalho;
- Talvez, esta nova geração com uma forte cultura de colaboração possa ajudar a superar a inércia que agora experimentamos ao instituir programas de mudança para implementar BIM, Sustentabilidade, Lean, e IPD dentro da AEC;
- Eu acredito que isto seja mais importante do que um foco em educar os alunos sobre as ferramentas de software de modelagem e autoria.
- A minha experiência em ensinar Arquitetos que nunca tenham usado o CAD 2D a aprender BIM, mostra ser muito mais eficaz. O paradigma do CAD 2D é muito difícil de ser removido;
- Na minha opinião educar os estudantes para o BIM é prepará-los para serem administradores de sistemas – criando e reutilizando conteúdo digital de todos os agentes da cadeia produtiva;
- Um dos suportes do BIM é a modelagem de objetos – construir objetos reutilizáveis que tenham inteligência dimensional, contextual, funcional e do ciclo de vida;
- Há 20 anos atrás a indústria já era sustentada pela tecnologia de bancos de dados orientados a objetos.
- Eu penso que qualquer curso deve ter como foco a Integração / Colaboração em BIM;
- Você pode ter um projeto modelado no mundo virtual, perfeito para o uso, com excelente estética, entretanto precisamos dar um passo atrás e considerar que ele ainda deve ser construído no mundo real;
- O quão boa é a qualidade da informação que você coloca no modelo? Os Construtores irão entender os requisitos do projeto?;
- Um projeto BIM totalmente integrado não é somente concebido e modelado em um ambiente virtual, mas obviamente construído no mundo real utilizando informações de Planejamento, Recursos, Custos e Detecção de conflitos;
- A execução de modelos BIM requer o envolvimento de TODAS as partes e não somente de Arquitetos e Engenheiros projetistas.
Questões-chave a tratar para a educação em BIM
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BIM é uma Tecnologia;
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BIM é um Meio de Comunicação;
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BIM é um Processo Colaborativo;
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BIM requer o entendimento da Construção no mundo real;
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BIM pode servir para múltiplas perspectivas e usos
1. BIM é uma Tecnologia
Entender tecnologia requer esses conceitos:
- O BIM é orientado a objetos paramétricos;
- Bancos de dados;
- Nível de detalhe;
- Modelagem de sólidos;
- Tecnologia da Informação para Colaboração (computação em nuvem, redes, equipamentos para big-rooms, servidores BIM);
- Padrões de softwares para compartilhamento de modelos (IFC, formato proprietário, etc.);
- Visualização (renderização, realidade virtual e realidade aumentada);
- Hardware específico.
2. BIM é um Meio de Comunicação
A comunicação em BIM requer:
- Conhecer qual informação é necessária para cada agente durante o ciclo de vida da edificação (projeto, obra, uso do edifício);
- Sistemas de classificação da informação (Omniclass, Uniformat);
- Princípios de comunicação (tipos de mídias, comunicações síncronas e assíncronas).
3. BIM é um Processo Colaborativo
Entender Colaboração requer conhecer:
- Quais tipos de colaboração são necessários para construir um modelo BIM de um edifício que conterá as informações necessárias para as necessidades de cada um dos agentes envolvidos;
- Arranjos contratuais para a contratação dos Projetos e da Obra;
- Como alinhar os interesses dos membros da equipe?;
- Os processos de projeto e construção não são lineares e cronológicos mas sub-processos paralelos.
4. A modelagem requer o entendimento do mundo real
- Os modelos consistem de objetos que representam a estrutura de componentes do mundo real;
- As ferramentas de modelagem fornecem bancos de dados de objetos que tem propriedades (dados e regras) que precisam ser entendidos;
- O modelador precisa entender as funções de cada objeto (o que eles fazem, como eles trabalham, como eles se conectam a outros objetos, como eles são construídos ou fabricados e como eles são mantidos pelo ciclo de vida).
5. O modelo serve a múltiplos usos e perspectivas
- Requisitos funcionais;
- Preferências estéticas;
- Iluminação, acústica;
- Acessibilidade;
- Gestão da manutenção;
- Uso da energia;
- Análises de sustentabilidade;
- Construtibilidade (incluindo análise de conflitos: “clash detection”);
- Planejamento e controle da produção;
- Pré-fabricação;
- Análise do modelo contra Normas (Prefeitura, Bombeiros, Acessibilidade, etc);
- Norma de desempenho;
- Segurança do trabalho.
Conclusões e recomendações
Cursos de graduação:
- Existem conceitos básicos de tecnologia e comunicação que são fundamentais para o uso efetivo do BIM;
- A competência em operar softwares BIM pode ser adquirida logo cedo;
- O BIM deve ocupar o lugar do CAD;
- A boa modelagem requer um bom conhecimento de tecnologia de construção e de métodos construtivos.
Cursos de pós-graduação:
- Inclusão de múltiplas disciplinas e desenvolvimento de projetos colaborativos multidisciplinares;
- Cobrir uma ampla gama de usos do modelo a partir de uma perspectiva do ciclo de vida da edificação;
- Cobrir os problemas do negócio (business) que são impactados pelo processo colaborativo em BIM.